sexta-feira, 20 de julho de 2012

Mulheres se manifestam contra decisão de Conselho de Medicina

 "MULHERES X CREMERJ"

Cremerj proíbe a participação de acompanhantes profissionais em maternidades e causa revolta

O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro publicou na última quinta-feira (19) uma resolução que proíbe mulheres de contarem com a assistência de obstetrizes, doulas e parteiras em hospitais maternidades, assim como, outra resolução que proíbe e pune médicos-obstetras que acompanhem partos domiciliares, ou ainda, aqueles que deem retaguarda para parturientes com necessidade de remoção de parto em casa para o hospital. 

Organizações Não-Governamentais, representantes de movimentos sociais e mulheres de todo o Brasil estão se manifestando em repúdio às resoluções através das redes sociais. No próximo domingo (22), elas planejam realizar um piquete em frente à sede do Cremerj, localizado na zona sul do Rio de Janeiro. 

As mulheres consideram que a decisão do Conselho contraria evidências científicas que comprovam a melhoria da qualidade da experiência do parto e a redução de intervenções médicas desnecessárias quando um parto é assistido por esses profissionais, que são qualificados para atuar nesse sentido. Já é conhecida e divulgada a importância das doulas e obstetrizes em um modelo de assistência obstétrica humanizado e centrado na mulher. As resoluções, inclusive, vão contra diretrizes do próprio Ministério da Saúde, que tem trabalhado nos últimos anos dentro da Política Nacional de Humanização da Saúde. 
Para elas, as resoluções entram em contradição com o próprio Código de Ética Médica, que fala do respeito à autonomia. “Capítulo I, inciso XXI – No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas”. 

As mulheres classificam a decisão do Cremerj como arbitrária. Em um país que alcança a primeira colocação mundial em realização de cesarianas, no qual as taxas desse tipo de cirurgia chegam a 52%, superando os 80% em hospitais privados e em alguns chegando a ultrapassar os 90%, essas resoluções podem ser consideradas como um retrocesso, ou, no mínimo, tendenciosas, por contribuírem para continuar perpetuando um modelo violento, que tira o poder e o direito de escolha da mulher, violando assim, seus direitos reprodutivos. Infração ética muito maior são as chamadas cesáreas eletivas sem indicação médica, realizadas sob pretextos não respaldados pela literatura. 

Diversos estudos demonstram que as consideradas altíssimas taxas de cesáreas em hospitais brasileiros não ocorrem a pedido das mulheres, uma vez que a maior parte delas continua demonstrando preferência por parto normal, sendo conduzidas no decorrer da gestação a mudarem de opinião pelos próprios obstetras. 

A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro já foi acionada e está investigando o caso através dos Núcleos de Direitos Humanos e de Defesa dos Direitos das Mulheres. Além disso, uma carta está sendo encaminhada ao Ministério da Saúde, à Secretaria de Direitos Humanos e ao Conselho Federal de Medicina cobrando um posicionamento em relação à decisão. 

Acompanhantes profissionais e evidências científicas

A participação de obstetrizes (profissionais formadas em curso superior de Obstetrícia) não somente integra o modelo transdisciplinar de assistência ao parto, como tem demonstrado resultados até superiores ao esperado. De acordo com a Biblioteca Cochrane, uma espécie de coleção de fontes de informação de evidências em atenção à saúde, em uma assistência promovida por obstetrizes, as mulheres têm menor risco de hospitalização antenatal, de analgesia regional e de parto instrumental. Ou seja: têm maiores chances de partos sem anestesia e parto vaginal espontâneo, além de maior sensação de controle durante o nascimento do bebê e mais facilidade para dar início ao aleitamento materno. 

Em relação às doulas (acompanhantes profissionais de parto, responsáveis pelo conforto físico e emocional da parturiente durante o pré-parto, nascimento e pós-parto), 21 ensaios clínicos com mais de 15 mil mulheres mostraram que aquelas que receberam esse tipo de suporte tiveram menor risco de relatar insatisfação com a experiência do parto, menor duração do trabalho de parto, menor risco de cesariana, entre outras vantagens.